Demolição – Igreja de Matosinhos

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Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 2
Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 2

O jornal Ponte da Cadeia, número 152, edição de 17 de maio de 1970, publicou depoimento de Geraldo Guimarães protestando contra a demolição da Igreja: "Mas dizem que o vigário nem admite conversa sobre a sua construção [da igreja nova] e a sua destruição [da igreja antiga]. E dizem mais: que ele outro dia fez um gesto feio dentro da igreja, 'dando uma banana' para os membros do Instituto Histórico e Geográfico, quando sobe das críticas que a entidade teria feito à sua destruição. Banana durante a missa. Sinal dos tempos. Não. Também na primeira missa, em 1500, os índios comiam banana".

Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 3
Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 3

Aspecto da criminosa demolição (a igreja era tombada pelo SPHAN, atual IPHAN) promovida pelo pároco local, o padre Jacinto Lovato, no ano de 1970. O jornal Ponte da Cadeia, número 152, edição de 17 de maio de 1970, publicou depoimento de Geraldo Guimarães protestando contra a demolição da Igreja: "Mas dizem que o vigário nem admite conversa sobre a sua construção [da igreja nova] e a sua destruição [da igreja antiga]. E dizem mais: que ele outro dia fez um gesto feio dentro da igreja, 'dando uma banana' para os membros do Instituto Histórico e Geográfico, quando sobe das críticas que a entidade teria feito à sua destruição. Banana durante a missa. Sinal dos tempos. Não. Também na primeira missa, em 1500, os índios comiam banana".

Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 4
Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 4

Em 07.05.1970, os membros do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei posicionaram-se oficialmente contra a derrubada da Igreja do Sr. Bom Jesus de Matosinhos. O protesto do Instituto foi "lido alto pelo padre [Jacinto Lovato], para os fiéis, na missa de domingo, com zombarias e declarações de desprezo ao IHG. (...) Tratou-se então de acelerar a demolição, de modo bárbaro, usando até dois tratores e cabos de aço para por abaixo o frontão, com a cruz de ferro trabalhada. (...) Os materiais foram vendidos: madeiras, ornatos de pedra, arco do cruzeiro, retábulo e finalmente a portada de pedra sabão. A Igreja estava fazendo, em 1970, exatamente 200 anos do início da sua construção."

Diante da gravidade dos fatos a presidência do IHG resolveu solicitar a ajuda do Bispo Diocesano daquela época, D. Delfim Ribeiro Guedes, tentando sensibilizá-lo para que se "evitasse o estrago ou a perda irreparável da portada da Igreja de Matosinhos, obra de talha em pedra sabão, que possuía inequívoco e evidente valor artístico e arquitetônico". O Bispo foi informado de que "as portas e janelas, todo o madeirame interno e as paredes, estavam em perfeito estado, tendo oferecido grande resistência à demolição, tendo sido inclusive necessário o uso de tratores para pô-las abaixo." A solicitação era para que D. Delfim ajudasse no sentido de que pelo menos a portada daquela Igreja ficasse nesta cidade "como recordação, talvez a única, que restara da Igreja do Sr. Bom Jesus de Matosinhos, e, principalmente, por ser a portada em pedra-sabão de inegável valor artístico, que a torna parte do patrimônio cultural da nação brasileira."

Os membros do Instituto solicitaram ao Bispo que "empenhasse no sentido de acompanhar a sua retirada, de modo a que se evite a danificação ou sua alienação a terceiros." D. Delfim prometeu agir para que a portada permanecesse aqui, mas infelizmente não cumpriu a palavra empenhada. O padre Sebastião Raimundo de Paiva ainda tentou comprar a referida portada por quatro mil cruzeiros, para que a peça permanecesse em São João del-Rei, mas o esforço foi inútil, já que ela estava prometida para ser vendida a um granfino do Estado de São Paulo. Altivo Sette ainda tentou demover o paulista de levar a portada, mas foi tudo em vão: "meu cunhado, Paulo Campos é testemunha presencial deste meu apelo. Dias depois chegava de SP um caminhão e lá se foi a portada. E também um ornato de pedra-sabão, que figurava um relógio e outras peças, que vi serem postas com guindaste, no caminhão. Talvez a pia batismal, que é igualmente de pedra-sabão." Finalizando, Altivo Sette comentou: "foi ultimada a operação... o Bispo faltou com a palavra e acobertou a transação que foi realizada, inclusive depois de uma importante decisão do Vaticano a respeito, e que eu havia publicado na imprensa local."

Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 5
Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 5

Em 07 de maio de 1970 os membros do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, através de ofício, posicionaram-se contra a derrubada da primitiva Igreja do Sr. Bom Jesus de Matosinhos, tendo sido aprovado o "mais veemente protesto quanto à demolição." Aquele templo era um bem cultural tombado (processo nº 68-38/SPHAN, inscrito no Livro do Tombo de Belas Artes, Vol. 1, fls. 2, em 04 de março de 1938). Através de ofício assinado pelos confrades Fábio Nelson Guimarães e Astrogildo Assis, os membros do IHG alertavam ao então pároco de Matosinhos, padre Jacinto Lovato, que a referida "advertência pretendia passar ao Reverendo a responsabilidade de tal destruição perante a posteridade, e propunha a recolocação das telhas no referido templo, em vista do bom estado do madeirame do telhado." O vigário ainda achou por bem "responder" aos protestos do IHG, através de ofício datado de 13 de maio de 1970, no qual, dentre outras coisas, escreveu: "Nenhum valor tem para mim protesto veemente ou sem veemência (...) O assunto é de exclusivamente da alçada da Igreja (...) Não aceitamos a intromissão de alheios à religião em assuntos de competência da mesma, ainda mais de um desconhecido IHG (...) As igrejas são para utilização dos fiéis e não para serem contempladas como pura arte de construção...". O protesto do Instituto foi "lido alto pelo padre, para os fiéis, na missa de domingo, com zombarias e declarações de desprezo ao IHG. (...) Tratou-se então de acelerar a demolição, de modo bárbaro, usando até dois tratores e cabos de aço para por abaixo o frontão, com a cruz de ferro trabalhada. (...) Os materiais foram vendidos: madeiras, ornatos de pedra, arco do cruzeiro, retábulo e finalmente a portada de pedra sabão. A Igreja estava fazendo, em 1970, exatamente 200 anos do início da sua construção."

Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 6
Demolição da Igreja de Matosinhos (autor ignorado) 6

A primitiva Igreja do Sr. Bom Jesus de Matosinhos, mesmo sendo tombada pelo IPHAN (processo nº 68-38/SPHAN, inscrito no Livro do Tombo de Belas Artes, Vol. 1, fls. 2, em 04 de março de 1938), foi jogada ao chão em 1970, pelo padre Jacinto Lovato. No ano de 2003, o então presidente do IHG de São João del-Rei provocou ao Ministério Público Estadual e, depois, ao Federal, para que ações se efetivassem em favor da recuperação da portada da Igreja para o patrimônio são-joanense, depois de descobrir que a peça fora irregularmente vendida (pelo padre demolidor) para o proprietário da Fazenda São Martinho da Esperança, em Campinas-SP, onde se encontra decorando os jardins daquela propriedade. O Processo nº. 2009.38.15.000812-0, que trata do "repatriamento" da portada, tramita na Vara Única da Justiça Federal – Subseção Judiciária de S. João del-Rei, com grandes possibilidades de que a peça seja devolvida para o lugar de onde ela nunca deveria de ter saído... Ainda que tardiamente e ainda que em parte, estamos rememorando a primeira luta dos membros do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, que à época da demolição lutaram bravamente contra o ato, infelizmente sem êxito. Se ocorrer a volta da portada, o acontecimento não será apenas revestido de importância material e/ou espiritual, mas será um ato carregado de muito simbolismo! O acontecimento, decerto, chamará a nossa atenção para os cuidados que devemos ter com o patrimônio cultural que ainda existe, e também com aquele que ainda não está tombado (no sentido de caído), mas que está se perdendo a cada dia...

"Não importa quais sejam os direitos de propriedade, a destruição de um prédio histórico e monumental não deve ser permitida a esses ignóbeis especuladores, cujo interesse os cega para a honra. Há duas coisas num edifício: seu uso e sua beleza. Seu uso pertence ao proprietário, sua beleza a todo o mundo; destruí-lo é, portanto, extrapolar o que é direito." (Victor Hugo).

Demolição da Igreja de Matosinhos (foto de Afonso Nogueira) 1
Demolição da Igreja de Matosinhos (foto de Afonso Nogueira) 1

No final da década de 1960 o pe. Jacinto Lovato já articulava a demolição desta histórica igreja. Além dela ser um magnífico exemplo de arquitetura religiosa e uma referência para os habitantes do bairro e da cidade, por ela passaram os Voluntários da Pátria, quando estavam a caminho da Guerra do Paraguai (1864/1870). São João del-Rei foi um dos municípios que mais concorreram com o envio daqueles Voluntários. A cidade, porém, não se limitava a mandar seus filhos para a Campanha da Tríplice Aliança, pois recebia festivamente as Companhias de Voluntários que por aqui passavam, como se deu, por exemplo, com aquelas que vinham das cidades do Sul de Minas. Grupos de Voluntários da cidade de Passos e de outros locais pernoitavam na Igreja e no dia seguinte assistiam a missa; depois se alimentavam e continuavam a marcha. De acordo com notícias amplamente veiculadas em jornais do Rio de Janeiro, a Comissão Promotora das Comemorações do centenário da Guerra da Tríplice Aliança, através do general Dióscoro Gonçalves do Vale (então chefe da ID-4/BH), dirigiu-se ao bispo diocesano de São João del-Rei, formulando-lhe veemente apelo no sentido de ser impedida a demolição do templo. Em resposta, o bispo respondeu ao general dizendo que "recebeu com o maior apreço o veemente apelo e que o assunto estava sendo estudado" e ainda que "esperava em Deus que tudo fosse resolvido satisfatoriamente". O jornal Estado de Minas, na sua edição de 28 de fevereiro de 1970, noticiava que "o telhado da sacristia da Igreja do Sr. Bom Jesus de Matosinhos acabava de desabar e até agora não foram tomadas providências para restauração da parte danificada". Contam que houve "colaboração para que o dito telhado desabasse", pois sempre houve a intenção do vigário de demolir a Igreja, com a conivência do bispo. Assim, apesar de bastante sólida, ela foi mesmo para o chão, em 1970, tendo à frente da diocese o bispo Delfim Ribeiro Guedes e como responsável pela paróquia de Matosinhos o padre Jacinto Lovato.

"Não importa quais sejam os direitos de propriedade, a destruição de um prédio histórico e monumental não deve ser permitida a esses ignóbeis especuladores, cujo interesse os cega para a honra. Há duas coisas num edifício: seu uso e sua beleza. Seu uso pertence ao proprietário, sua beleza a todo o mundo; destruí-lo é, portanto, extrapolar o que é direito." (Victor Hugo).

Demolição da Igreja de Matosinhos (foto de Afonso Nogueira) 2
Demolição da Igreja de Matosinhos (foto de Afonso Nogueira) 2

A primitiva igreja de Matosinhos foi construída a partir dos idos de 1770. Em 19 de maio de 1774 já se achava erguido o templo em honra ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos, devoção originária da terra portuguesa e trazida pelos colonizadores. Durante aproximadamente 200 anos "campeou, qual linda garça, entre a verdura, a risonha capela do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, para onde afluíam romeiros e grande multidão de povo, por ocasião das Festas do Espírito Santo que se celebravam com toda magnificência, renovando-se algumas vezes, os costumes antigos de cavalhada, bailados e corridas de touros."

Altivo de Lemos Sette Câmara, eminente historiador, deixou escrito o seu testemunho de que em 1970 a igreja era sólida mas que, mesmo assim "a demolição entrou em ritmo diabólico de 'time is money'. O frontão veio abaixo, amarrado por dois cabos de aço e puxado por dois tratores. A cruz de ferro, que permanecera inclinada muitos dias, cai não cai, veio abaixo com o frontão. Uma perfeita lição de barbárie, dada 'de graça' a uma população de 15.000 almas (ou corpos?)". Altivo revelou que a portada foi vendida para um granfino de São Paulo depois de o bispo não honrar a promessa de que ela ficaria na cidade: "Chegou de São Paulo um caminhão e lá se foi a portada. E também um ornato de pedra sabão, que figurava um relógio e outras peças de pedra sabão que vi serem postas com um guindaste, no caminhão..."

A Igreja era tombada (processo nº 68-38/SPHAN, com inscrição no Livro do Tombo das Belas Artes, Vol. 1, fls.2, data de 04 de março de 1938). Naquela época, os integrantes do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei formularam veementes protestos contra a demolição do templo, mas não foram ouvidos e a Igreja foi demolida pelo iconoclasta padre Jacinto Lovato; este ato passou para a história como um dos maiores crimes de todos os tempos contra o patrimônio são-joanense.

"Não importa quais sejam os direitos de propriedade, a destruição de um prédio histórico e monumental não deve ser permitida a esses ignóbeis especuladores, cujo interesse os cega para a honra. Há duas coisas num edificio: seu uso e sua beleza. Seu uso pertence ao proprietário, sua beleza a todo o mundo; destruí-lo é, portanto, extrapolar o que é direito." (Victor Hugo).